sábado, 29 de agosto de 2009

EX-PRESOS POLÍTICOS E O DANO MORAL

EX-PRESOS POLÍTICOS E O DANO MORAL


Não há ação sem conseqüências jurídicas. Após o golpe militar de 1964 foi instaurado no país atos ditatoriais impondo aos brasileiros e estrangeiros perseguição, prisão e, inclusive, morte. A Lei de Anistia, apenas, permitiu a pretensa reabertura do país aqueles que estavam exilados e presos, restando, claramente, grande lacuna nos danos causados de natureza material e moral.


A Constituição Federal previu a possibilidade de reparação, no entanto, restava a necessidade de legislação infra-constitucional no sentido de contemplar e fixar parâmetro para tal fim. Em 1995 veio a Lei que previu a reparação material aos familiares dos desaparecidos políticos(mortes), limitando-a em R$ 100.000,00, omitindo a reparação quanto aos perseguidos e ex-presos políticos vivos ou falecidos. Somente em 2002, por meio da Lei n. 10.559, o Estado Brasileiro reconheceu o erro do governo militar e fixou parâmetros para reparação material aos perseguidos e ex-presos políticos, usando dois critérios, quais sejam: 1) reparação econômica em prestação única aqueles que foram perseguidos e presos sem condições de prova de vinculo laboral(por exemplo: estudante), correspondente a 30(trinta) salários por ano de perseguição, limitando a R$ 100.000,00; e, 2) reparação econômica mensal, permanente e continuada quando a vítima prova que à época mantinha vínculo laboral rompido por perseguição política correspondente ao valor mensal que estaria percebendo na melhor condição se atualmente estivesse trabalhando, cujo valor retroage a 05(cinco) anos, não existindo limite ou teto da reparação, na qual o ex-preso político passa a receber mensalmente tal quantia acumulada com o retroativo.


A Lei n. 10.559/2002 estabeleceu a criação da Comissão de Anistia, junto ao Ministério da Justiça, para processar e julgar os pedidos de reparação econômica promovidos pelos ex-presos políticos. Milhares deduziram pedidos junto àquela Comissão, demonstrando, com isso, a amplitude de perseguição política instaurada pelo Estado opressor à época.


Em suma, o governo brasileiro adotou legislação infra-constitucional para regulamentar a devida reparação econômica de natureza material, não sendo contemplada a reparação indenizatória de natureza moral, ou seja, a Lei n. 10.559/2002 não a previu, mesmo porque, não existe na legislação brasileira previsão do valor indenizatório a título de danos morais permitindo ao julgador fixá-la por critérios subjetivos dentro da orientação jurisprudencial e doutrinária.


A diferença da natureza indenizatória estabelecida entre o dano material e moral é prevista na legislação vigente, inclusive podem ser cumuladas, já que trazem autonomia uma da outra e tem finalidades diferentes, portanto, não se confundem.

Esses mesmos fundamentos são aplicáveis às indenizações adequadas aos perseguidos e ex-presos políticos, pois, além da reparação econômica material prevista na Lei n. 10:559/2002 alcançada junto à Comissão de Anistia, há direito à indenização por danos morais, eis que, o primeiro tem Lei especial e o segundo, dano moral, é imprescritível já que se trata de direito indenizatório decorrente da personalidade da pessoa humana.


Qualquer questionamento quanto a esse fundamento, ou seja, quando ao direito de cumular ambas indenizações – material e moral – respectivamente, obtida junto à Comissão de Anistia e na via judicial, no caso dos ex-presos políticos, não mais ganha importância, eis que, o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA já pacificou entendimento que são cumuláveis, autônomas e independentes, podendo a reparação material ser requerida administrativamente junto à Comissão de Anistia com base na Lei n. 10.559/2002; e a indenização moral requerida pela via judicial. Uma não anula a outra. Tem critérios diferentes. Condições claras para sua respectiva fixação, assim, está proclamado o direito à indenização por dano material e moral aos ex-presos políticos.


Outra não poderia ser a interpretação porque a lei infra-constitucional – Lei n. 10.559/2002- para um fim específico não pode anular outros diplomas legais existentes como por exemplo o Código Civil que prevê a indenização por danos morais decorrente de atos que ferem a personalidade da pessoa. Cada coisa em seu lugar. A natureza jurídica sempre deve ser observada para evitar injusta e indevida exclusão de direitos.


O Estado Brasileiro tem dívida com aqueles que lutaram pela redemocratização do país. Eles foram prejudicados em aspectos mais íntimos de suas vidas, da personalidade da pessoa humana. A humilhação, o terror e torturas foram métodos adotados para constrangê-los de forma reprovável e desumana. Aliás, tal dívida histórica deve ser resgatada justamente para ressaltar o erro e, também, para afastar outros que pudessem acontecer contra os cidadãos.


Além do aspecto civil no campo da indenização também há o aspecto penal que deve ser revisto, porque os crimes de tortura lamentavelmente praticados pelos agentes do governo militar contra aqueles são imprescritíveis! A responsabilidade penal subsiste nesse caso, ainda passível de punição. Os crimes praticados à época são contra a humanidade, num momento em que o Brasil já havia firmado como signatário das Declarações de Direitos Humanos – de 1948 – absolutamente descumpridas. No entanto, tal discussão não será objeto dessas breves considerações, vez que, nas mesmas pretendemos demonstrar o direito à indenização cumulada quanto ao dano material e moral.


Diante disso, ressaltamos aos perseguidos e ex-presos políticos do Brasil que têm direito à reparação econômica material administrativamente junto à Comissão de Anistia, em Brasília, bem como, têm direito à indenização por danos morais com base nos mesmos fatos – perseguição política – pela via judicial conforme prevê a legislação brasileira. Ademais, se há responsabilidade por parte da União Federal por conta dos atos do então governo militar, também, há responsabilidade solidária dos estados membros da federação, que, à época, permitiram e contribuiram em seus territórios com todo aparato estatal para perseguir e prender em seus estabelecimentos prisionais aqueles que eram contra o Regime Militar.


Ex-presos políticos: o direito à indenização perdura! Podem, além da reparação econômica material a ser obtida ou efetivamente obtida dos estados membros da federação(comissões específicas) ou da própria União Federal(Comissão de Anistia), também, ingressarem com ações judiciais de indenização por danos morais decorrentes da perseguição. Tal direito já está pacificado no Superior Tribunal de Justiça o qual já decidiu que os estados membros da federação e a União Federal devem, além das reparações administrativas, indenizar os danos morais experimentados pela vitimas do Regime Militar.


É de direito! O direito deve ser aplicado. Os danos devem ser reparados suficientemente. A luta pelo direito continua. Fica aqui o registro quanto ao direito, mas, sobretudo, as devidas homenagens aqueles que triunfaram às adversidades para nos permitir um Estado de direito que ainda busca a democracia em sua plenitude.

Wilson Luiz Darienzo Quinteiro, advogado no Paraná e em outros estados; articulista e escritor; autor do livro: “EX-PRESOS POLÍTICOS: O DIREITO À INDENIZAÇÃO PERDURA!” e político no Paraná.

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